Evento será na tarde de sábado (23), na Igreja Batista do bairro Alfa Sul
MANHUAÇU – Acontece neste sábado (23), das 14h30 às 17h, na Igreja Batista do bairro Alfa Sul, o 5º Encontro de Mães de Autistas de Manhuaçu e Região. O neuropediatra Reinaldo Regis Silva será o palestrante. Para saber um pouco mais a respeito deste evento e também como são os cuidados com filho autista, o DIÁRIO entrevistou Roselaine Aparecida Perígolo Caldeira, Érica de Souza Brito e Rogéria Pires Souza, que contam um pouco dessa luta permanente à procura de melhores condições de vida para seus filhos para que as políticas públicas sejam postas em prática.
ROSE
Roselaine Aparecida Perígolo Caldeira, a ‘Rose’, mãe de Pedro Lucas, 9, descreve como surgiu a ideia de montar a Associação. Conforme Rose, durante as conversas nos corredores da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), nas salas dos consultórios terapêuticos e nos corredores das escolas, as mães sentiram a necessidade de criar uma entidade que ajudasse nessa causa. “Acabamos nos unindo para podermos lutar, trocar experiências. Hoje buscamos algo mais para nossos filhos. Sendo assim pensamos em montar uma associação para termos força e buscarmos políticas públicas e necessárias para adequar cada criança, pois cada uma delas tem sua necessidade diferenciada. Queremos lutar para trazer essas capacitações para Manhuaçu, afinal cada uma dessa crianças precisar ser trabalhada em determinado método. São vários tipos de terapia, então esses profissionais têm que estar capacitados para isso. Hoje nós sabemos que tem que ter pelo menos dez horas semanais de terapia, mas o que o município não dá nem uma hora de terapia. Também buscamos que as escolas possam entender essa situação, tendo material adaptado”.
A Associação já tem cadastradas cerca de 80 mães. Os encontros acontecem uma vez por mês e geralmente um profissional da área de saúde é um dos convidados. “Queremos somar para que as coisas aconteçam, sabemos das necessidades de nossos filhos. Também orientamos estas mães que não conseguem entender a situação de seus filhos. Não adianta ter a terapia e em casa os pais ficarem de braços cruzados. Os pais têm que ser treinados para isso, se não tiver esse treinamento não saberá o que vai fazer com seu filho. Autismo não tem cura, o que nós temos é diminuição dos sintomas, das características. De forma adequada, conseguimos que a criança tenha uma vida praticamente normal”.
Além do encontro deste sábado, as integrantes da Associação esperam que no ano que vem ocorra uma audiência pública para tratar desse assunto. “Temos falado com o vereador Rodrigo, que muito tem nos ajudado, ele vestiu a nossa camisa e irá nos ajudar a fazer essa audiência pública e se Deus quiser, irá acontecer em fevereiro de 2020. No momento dependemos que o deputado que preside a comissão que trata desse assunto na Assembleia Legislativa esteja presente. Esse problema que vivemos em Manhuaçu, Belo Horizonte também está vivendo, assim como outras cidades do interior. É uma busca de todo mundo, está na hora de todos abraçarem essa causa”, convoca Rose.
Quem quiser saber mais sobre os trabalhos da Associação, basta entrar em contato com a Rose pelo telefone (33) 98447 4283. “As portas estão abertas para receber cada mãe que queira abraçar essa causa”, avisa a mãe do Pedro Lucas.
ÉRICA
Érica de Souza Brito é mãe de Abraão, 3 anos. Ela destaca os avanços que o tratamento vêm dando na vida de seu filho e reforça sobre a importância do diagnóstico precoce. “O tratamento do meu filho foi iniciado quando ele tinha um ano e oito meses. Corremos atrás de terapia, corremos atrás de um tratamento melhor com todos os especialistas. Hoje vejo por ter começado o tratamento cedo, por eu e meu marido termos aceitado, tivemos a mente aberta, isso fez a diferença na vida do Abraão, pois hoje ele está falando, está na escolinha, sabe o alfabeto e está tendo uma vida normal”.
Conforme Érica, “seu filho até um ano e meio era uma criança igual a todas as outras. Depois que começaram a vir alguns ‘atrasos’. Ele parou de falar. Então, pedimos aos pais que quando sentirem alguma diferença no filho, que seja mínima, mas que dê um pouquinho mais de atenção”.
Érica descreve que após o diagnóstico, ela e seu marido não tiveram nenhum tipo de rejeição e hoje ela vê a importância desse tipo de atitude. “Muitos pais ainda têm essa resistência em não aceitar que o filho seja diferente, que tenha uma característica diferente. Hoje eu vejo que quando os pais agem assim, quem é prejudicado é a própria criança, que se isola. Porém, quando o tratamento começa cedo vai quebrando a rigidez do comportamento da criança”, explica Érica.
Ela faz questão de frisar que autismo não é uma doença, “Autismo é uma condição especial da criança. Quando os pais perceberem alguma coisa diferente, que procurem um especialista”, observa a mãe do Abraão.
ROGÉRIA
Rogéria Pires Souza é mãe de João Pedro, 13 anos. Ela conta que seu filho foi diagnosticado como autista quando ele tinha dois anos e três meses pelo médico Walter Camargo Júnior, que é de Belo Horizonte. “Aqui em Manhuaçu eu ‘esbarrei’ nos profissionais. Eu não consegui a escola, eu não consegui fono (fonoaudiólogo) especializado, eu não consegui terapeuta ocupacional e uma equipe multidisciplinar que toma conta disso e assim dar andamento ao tratamento dessas crianças. Na verdade o tratamento não é o médico em si, ele ajuda com a medicação, diagnóstico, mas na hora do tratamento é a equipe multidisciplinar que faz toda a diferença”, ressalta.
Ela recorda que por volta de 2012, quando seu filho à época tinha quase cinco anos, chegou a entrar até na justiça para que João Pedro fosse atendido. “Eu não tive ajuda aqui na Secretaria de Saúde, não consegui ajuda na Secretaria de Educação. Eu não tinha condições financeiras, eu não tinha o Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Foi uma luta muito grande, mas consegui fora por intermédio da justiça. Através desse tratamento em Guarapari (ES) que as coisas foram deslanchando”.
Durante toda essa ‘luta’, como costuma frisar Rogéria, ela conta que tomou muita medicação controlada para saber lidar com tudo isso. “João Pedro tinha crises de birra. A criança, às vezes, não entra no ônibus, um carro que passa e ela tampa os ouvidos, já que integração sensorial dela é muito aguçada. Pessoas chegam e colocam a mão, aí a criança grita mais ainda porque eles não gostam de contato físico. Porém na verdade, é até um mito essa parte, as crianças gostam de carinho, meu filho é super carinhoso. Isso é falta de um tratamento também porque eles não são compreendidos, quando passamos a compreender a criança e entramos no seu mundo, começam os abraços, os cheirinhos, os toques. Tudo funciona. Meu filho é diagnosticado com autismo severo e hoje em dia ele convive muito bem na sociedade. Ele fala, canta. As fonos daqui disseram que ele nunca iria falar. Isso tudo foram conquistas que nós tivemos”.
A respeito da escola, Rogéria Pires relata que esse é outro problema enfrentado. “Você coloca na escola, que se diz inclusiva e que irá dar todo o suporte, mas quando a criança chega na escola, começa a esbarrar num monte coisa. A criança não fica, não tem profissional que consiga segurar a criança na escola. É muito detalhezinho que tem na questão ‘autismo’, até mesmo na questão do diagnóstico”.
De acordo com Rogéria, foi feito em 2012 um acordo entre prefeitura e Ministério Público e um convênio foi firmado para tratamento de autistas. “O município fez um convênio através de uma instituição, mas que não está atendendo toda a demanda, Então é muito difícil. Tem muitas mães na fila de espera e nossas crianças não podem esperar. O tratamento tem que começar ontem. Tem crianças com grau severo, elas não são entendidas, não falam e não conseguimos colocá-las em nenhuma instituição. Se o SUS (Sistema Único de Saúde) não ajudar, os tratamentos são muito caros. Não dá pra conciliar com as despesas da casa devido ao custo desse tratamento. Uma consulta no valor de 1.400 reais é algo surreal”. Conforme Rogéria Pires, falta qualificação por parte do município, “que preferiu uma coisa mais fácil, no caso terceirizar esse atendimento”. Ela complementa dizendo que é necessário ter controle dessa terceirização.
Em sua percepção, Rogéria explica o que falta. “Eu acredito que ainda falta muito, estamos apenas começando. O autismo começou a ser falado em 1943. Hoje se fala mais de autismo, mas não só estamos falando, mas o que estamos buscando, nós não estamos conseguindo. Caso não tenha uma criança autista em sua família, você nunca irá abrir seus olhos para essa questão”.
Ela fala da questão da conscientização. “O que a gente ouve mais por aí é ‘seu filho é muito mimado’. Parecem birras, mas não são birras. Já cansei de sentar com meu filho na praça, no chão, porque ele não entrava no ônibus. Meu marido trabalhando fora e ele gritava ao extremo e eu tinha que ligar pra casa. Hoje em dia a mídia mostra o autismo assim ‘é lindo’, mas para aquele que toca violão, aquele que é esperto demais, aquele que fala sete idiomas, mas ninguém que falar do autismo severo, ninguém quer falar da criança que está batendo a cabeça, que está batendo no coleguinha, já que não tem expressão verbal. Ele tenta se expressar de um jeito diferente, mas as pessoas não entendem. É muito fácil falar da criança que tá se desenvolvendo, mas a nossa realidade aqui no município é outra. O que vemos são crianças que não são assistidas, não tem medicamento. Começamos agora essa associação e queremos chamar essas mães. Não nos escondemos e queremos ser vistas como mães de autistas sim, pois nossos filhos são nossos orgulhos, mas parece que as pessoas querem fechar os olhos para isso, não querem ver essa realidade”.
Ao final Rogéria fala do desejo das mães que integram a Associação. “Hoje só queremos os nossos direitos, queremos que a sociedade veja nossos filhos com outros olhos. São crianças maravilhosas, são crianças que tem a capacidade de aprender”, conclui a mãe de João Pedro.