Ildecir A.Lessa
Advogado
O que se vê nos noticiários exaustivos é um cenário de que, os mercados financeiros de todo o mundo já refletem os impactos dessa crise e, muito embora ainda existam incertezas quanto aos seus impactos a longo prazo, várias medidas podem ser adotadas agora para melhorar a situação. Não existem respostas certas ou estratégias simples diante de cenários incertos, sobretudo quando esses cenários são resultantes de contextos mundiais.
O certo é que, no dia 31 de dezembro de 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) foi alertada sobre vários casos de pneumonia na cidade de Wuhan, província de Hubei, na República Popular da China. Em 30 de janeiro de 2020, a OMS declarou que o surto do novo coronavírus constitui uma Emergência de Saúde Pública. Em 11 de março de 2020, a COVID-19 foi caracterizada pela OMS como uma pandemia. O termo “pandemia” se refere à distribuição geográfica de uma doença e não à sua gravidade. A designação reconhece que, no momento, existem surtos de COVID-19 em vários países e regiões do mundo. A crise instaurou em todo mundo e, em tempos de crise global, como a causada pela disseminação do coronavírus e da Covid-19, é mais importante garantir a arrecadação do Estado ou amparar a sobrevivência dos entes privados por meio da suspensão de pagamentos de impostos? Poderão as empresas se beneficiarem da prorrogação dos pagamentos de PIS, Cofins e contribuição previdenciária dos meses de março e abril para julho e setembro, respectivamente? A maioria dos países está suspendendo o pagamento dos impostos para ajudar as empresas e pessoas físicas a enfrentarem os efeitos da crise causada pelo Estado de Calamidade.
O certo é que, a crise econômica causada pelas medidas de contenção do coronavírus vem afetando a saúde financeira das empresas. Passada a epidemia, elas podem pedir que o Estado seja responsabilizado por suas dívidas. As medidas de isolamento social recomendadas pela Organização Mundial da Saúde desaceleram a economia. O Fundo Monetário Internacional projeta queda de 5,3% no produto interno bruto do Brasil em 2020. Com a queda no consumo, o faturamento das empresas também cai. E muitas ficarão sem dinheiro para pagar tributos, fornecedores e empregados. Durante a crise da Covid-19, tem havido diversos conflitos federativos e questionamentos sobre a constitucionalidade de normas editadas para combater a doença. Terminada a epidemia, atos estatais fundamentados em leis julgadas inconstitucionais podem justificar pedidos indenizatórios contra União, estados e municípios. Bancos públicos também poderiam oferecer linhas de crédito favoráveis para as atividades econômicas mais afetadas pela crise. O Conselho Nacional de Justiça aprovou uma recomendação para orientar os juízes e uniformizar o tratamento dos processos de recuperação judicial durante a epidemia do coronavírus.
Como forma de frear a disseminação do novo coronavírus e evitar um colapso na economia brasileira, o governo brasileiro vem, quase que diariamente, editando leis, emitido decretos, portarias e Medidas Provisórias para impor medidas preventivas e restritivas, resultando, entre outras coisas, na redução de circulação de pessoas nas ruas, o fechamento de cinemas e teatros, bares, lojas, shopping centers, de pontos turísticos, de escolas, fronteiras e estabelecimentos públicos, na redução do movimento de clientes nos restaurantes, priorizando o serviço de delivery, com entrega sem o contato físico, além do isolamento social. A realidade atual de restrições de circulação de pessoas impostas pelo governo, não apenas o brasileiro, mas de todos os países, fez com que a população se adaptasse ao home office. Diante disso, os espaços físicos de trabalho (sejam alugados, sejam próprios) não estão sendo utilizados temporariamente, mas o aluguel continua devido, assim como os demais encargos de um imóvel.
Diante do desequilíbrio econômico-financeiro contratual em função do impacto causado pelo desaquecimento da economia, é impossível não pensar na redução de receita e custos. Nesse cenário, é nítido notar que a relação locatícia é diretamente afetada, tornando-se necessária a renegociação dos aluguéis, para assim evitar a rescisão do contrato de locação ou o despejo por falta de pagamento de aluguel e demais encargos. De acordo com a definição ampla e genérica do artigo 393 da Lei 10.406/02 (Código Civil), as hipóteses de caso fortuito ou força maior geram efeitos que são possíveis de evitar ou de impedir e, sendo configurada, o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles se responsabilizado.
De acordo com a Teoria da Imprevisão dos Contratos (Rebus sic stantibus), no ordenamento jurídico brasileiro é possível que um contrato seja alterado, sempre que as circunstâncias que envolveram a sua formação não forem as mesmas no momento da execução da obrigação contratual, de modo a prejudicar uma parte em benefício da outra. Isso envolve toda a relação jurídica contratual, quer seja bancária, de compra e venda de bens, de financiamento da casa própria, devido a necessidade de colocar o necessário reequilíbrio nas relações contratuais privadas. O certo é que, cada empresa, cada pessoa física deve desenvolver um plano de Gerenciamento da Crise, antecipando alguns eventos, para tentar minimizar os impactos que doravante irão acontecer.