Consciência Negra, sim
O Dia da Consciência Negra é comemorado em 20 de novembro e foi oficializado em 2011. Este ano, passou a ser feriado nacional. A data homenageia Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, que morreu nesse dia em 1695. A data também serve para lembrar e combater o racismo no Brasil. Porém, é também uma semana que nos deparamos com diversas opiniões contrárias a celebração da data. Curiosamente, a grande maioria das pessoas que se dizem contra uma data pra celebrar a Consciência Negra, demonstram boa dose de ignorância sobre nossa história como nação, consequentemente, um desconhecimento enorme sobre pautas raciais. Estranhamente, essas mesmas pessoas não se posicionam contrárias a outras datas (Dia da Mulher, Dia das Crianças, Dia do Índio e tantas outras) Porque só a Consciência Negra incomoda tanto?
A data de 20 de novembro tem objetivos de também chamar atenção para uma reflexão maior, provocar debates, serve ainda como um holofote que coloca em evidências problemas estruturais de nossa sociedade, muitos deles interligados com o racismo. Obviamente, não será uma mês, uma semana, tampouco um dia no ano, onde todas às questões que assolam o povo negro a anos serão solucionados como um passe de mágica. Afinal, são questões históricas, presentes em nosso meio, desde que aqui desembarcou o primeiro navio trazendo nossos antepassados para serem escravizados. Mas, a semana da Consciência Negra é importante, principalmente, para conscientizar às novas gerações de pretos e pardos. Essa tomada de consciência está relacionada com o processo em que a pessoa se percebe negra e se identifica com as suas raízes históricas e culturais, situações relacionadas com a formação da identidade de um indivíduo afrodescendente.
Conta essa história direito
Aprendi em meu tempo de escola, que meus antepassados livros escritos por autores brancos, que meus ancestrais “eram escravos”. Foi me ensinado também que “uma princesa muito generosa, no dia 13 de Maio de 1888, assinou uma lei que que libertou os escravos, e fomos felizes para sempre”.
Em cima dessa narrativa, nossa sociedade atual construiu toda uma estrutura racista que tá cada vez mais presente e segue excluindo grande parte dos brasileiros. Pra começar a desconstruir essa narrativa contada por quem escravizou, é preciso contar essas histórias direito. Como escrevi nos artigos anteriores desde a captura dos negros na África, e a chegada em solo brasileiro, a enorme maioria eram pessoas livres, alguns reis e rainhas em suas aldeias, homens, mulheres e crianças que viviam livres. Portanto, não eram escravos. Escravizados foram depois de capturados e acorrentados como animais. Muitos inclusive tinham profissões e conhecimentos de mineração por exemplo.
O que diziam os escravocratas?
A libertação dos escravizados começou muito antes do que nos é ensinado na escola. Várias revoltas, nascimento de quilombos já era uma pressão. O movimento abolicionista entre 1868 e 1888 no Brasil contou com pressão externa. Na época, quase todos os países ocidentais já tinham acabado com a escravatura e nós éramos a exceção. Aliás, esse era um dos argumentos a favor da abolição. Os argumentos contra a escravidão já eram todos conhecidos e para nós parecem evidentes. Mas, os CONSERVADORES obviamente eram contra, representavam boa parte da elite econômica, que se beneficiava do trabalho escravo e que, mesmo sabendo que um dia seria necessário fazer a transição para outro regime, tentava prolongar seus ganhos enquanto fosse possível. Não tendo argumentos frontais contra a escravidão, defendiam-na como podiam, impondo o medo que as mudanças podem sempre causar.
O senador João Maurício Wanderley — o Barão de Cotegipe, porta-voz da bancada escravista no Senado — declarou que a abolição mergulharia o país em uma crise econômica, com consequências políticas. E após a sanção da lei pela princesa Isabel, afirmou que isso causaria o fim do Império.
“Precisamos dos escravos. A senhora acabou de redimir uma raça e perder o trono”
Não foi coincidência, em 1889, aconteceu a proclamação da República e a família real perdeu o trono. A elite branca escravocrata passou a exigir indenização por terem perdido “seus escravos”. Anos depois, essa reparação aconteceu com inúmeros benefícios para trazer imigrantes europeus fugindo das guerras para trabalharem nas lavouras. A diferença é que a relação não era de senhor e escravo. Muitas das terras cultivadas por escravizados por séculos, foram repassadas para imigrantes. Já o povo negro, foi empurrado para os morros com uma mão na frente e outra atrás. Assim nasceram às primeiras favelas no Brasil.
Outros argumentos sórdidos e absurdos eram propagados para impor medo a elite branca. Mas, esse de que o país seria “destruído” se os negros fossem libertados, é o mais repugnante de todos.
Muito além da princesa
Três homens negros estavam entre as principais personagens históricas atuantes no abolicionismo brasileiro. Eram eles: Luiz Gama, José do Patrocínio e André Rebouças. Além desses que vamos destacar numa próxima oportunidade, temos a influência negra em todos os momentos. O maior escritor brasileiro de todos os tempos, Machado de Assis, que os livros tentaram embranquecer. E claro, a inspiração da data de hoje Zumbi dos Palmares.
Até uma próxima,
Sawubona!
“Significa literalmente “vejo você, você é importante para mim e eu te valorizo”. É uma forma de enxergar o outro, de aceitá-lo tal como é, com suas virtudes, nuances, e também com seus defeitos”
Rogério Silva
@rogeriosiva89fm