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Campanha Setembro Amarelo aborda a questão do suicídio. Um tema delicado, que a sociedade ainda se recusa a debater. Neurologista Leonardo Condé fala sobre os cuidados necessários ao tratar desse assunto

 

DA REDAÇÃO – Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria – ABP, em parceria com o Conselho Federal de Medicina – CFM, organiza nacionalmente o Setembro Amarelo. O dia 10 deste mês é, oficialmente, o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, mas a campanha acontece durante todo o ano.

São registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de um milhão no mundo. Trata-se de uma triste realidade, que registra cada vez mais casos, principalmente entre os jovens. Cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias.

Com o objetivo de prevenir e reduzir estes números a campanha Setembro Amarelo cresceu e agora o país inteiro trata dessa questão. Para falar desse assunto, o DIÁRIO entrevistou o neurologista Leonardo Condé, que é enfático ao dizer: “Requer entender que o suicídio e suas causas são doenças que devem ser tratadas com respeito, carinho e compreensão. Na realidade trata-se de um problema de saúde pública! O próprio paciente, portador de patologia mental que potencializa o risco de suicídio, carrega consigo um tabu e preconceito em relação ao tema”.

 

Há muito tabu e preconceito em relação ao suicídio. Isso dificulta que o tema seja abordado de maneira mais clara e objetiva? Quais os cuidados precisamos ter ao falar de suicídio?

Sim, o suicídio é um tabu e existe preconceito sobre esta situação. Erros e preconceitos vêm sendo historicamente repetidos, contribuindo para formação de um estigma em torno da doença mental e do comportamento suicida. O estigma resulta de um processo em que pessoas são levadas a se sentirem envergonhadas, excluídas e discriminadas, que para mudar esta situação requer um esforço coletivo, com programas governamentais apoiados pelos profissionais de saúde e participação de toda sociedade. Requer entender que o suicídio e suas causas são doenças que devem ser tratadas com respeito, carinho e compreensão. Na realidade trata-se de um problema de saúde pública! O próprio paciente, portador de patologia mental que potencializa o risco de suicídio, carrega consigo um tabu e preconceito em relação ao tema. O suicídio não é aceito socialmente e as pessoas apresentam dificuldades em falar no assunto, seja por ignorância, preconceito ou estigma.

O tabu e preconceito dificultam a abordagem do tema de forma clara e objetiva. Os cuidados que precisamos ter em relação ao suicídio são: acabar com o preconceito, entender sobre o assunto e desenvolver a empatia.

É muito difícil compreender porque um determinado indivíduo decide cometer suicídio. Em sua opinião, por que, diante de situações semelhantes, algumas pessoas se precipitam num ato suicida e outras não?

 

Cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam relacionados a transtornos mentais. Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias.  Ao analisar estes dados, percebemos que a grande maioria das pessoas que cometem suicídio apresentam problemas que comprometem sua saúde mental. Dentre as funções mentais estão os sentimentos e o comportamento. Provavelmente estas pessoas apresentam uma forma diferente de perceber suas emoções e determinar seu comportamento. Ainda não temos um marcador biológico para as doenças mentais, mas provavelmente há alterações nos circuitos cerebrais, com desequilíbrio nos neurotransmissores que nos permitirá no futuro comprovar que as doenças mentais merecem a mesma atenção e respeita que as outras doenças. Cada patologia limita o paciente de forma diferente. Um paciente com fratura na perna, apresenta maior dificuldade de locomoção. Determinadas patologias mentais podem limitar sua resposta a fatores estressantes. As pessoas são diferentes e respondem de forma diferente frente a mesma situação.

 

Geralmente a pessoa que pensa em tirar sua vida costuma dar sinais?

A OMS (Organização Mundial da Sáude) aponta três características psicopatológicas comuns no estado mental dos suicidas. São elas:

  • Ambivalência: o desejo de viver e de morrer se confundem no sujeito. Há urgência em sair da dor e do sofrimento com a morte, entretanto há o desejo de sobreviver a esta tormenta. Muitos não aspiravam realmente morrer, apenas queriam sair do sentimento momentâneo de infelicidade, acabar com a dor, fugir dos problemas, encontrar descanso ou final mais rápido para seus sofrimentos.
  • Impulsividade: o suicídio, por mais planejado que seja, parte de um ato que é usualmente motivado por eventos negativos. O impulso para cometer suicídio é transitório e tem duração de alguns minutos ou horas. Pode ser desencadeado por eventos psicossociais negativos do dia a dia e por situações como: rejeição; recriminação; fracasso; falência; morte de ente querido; entre outros.
  • Rigidez: quando uma pessoa decide terminar com a sua vida, os seus pensamentos, sentimentos e ações apresentam-se muito restritivos, ou seja, ela pensa constantemente sobre o suicídio e é incapaz de perceber outras maneiras de enfrentar ou de sair do problema. Estas pessoas pensam rígida e dramaticamente pela distorção que o sofrimento emocional impõe. Todo o comportamento está inflexível quanto à sua decisão: as ações estão direcionadas ao suicídio e a única saída possível que se apresenta é a morte; por isso é tão difícil encontrar, sozinho, alguma alternativa. O funcionamento mental gira em torno de três sentimentos: intolerável (não suportar); inescapável (sem saída); e interminável (sem fim). Existe uma distorção da percepção de realidade com avaliação negativa de si mesmo, do mundo e do futuro. Há um medo irracional e uma preocupação excessiva. O passado e o presente reforçam seu sofrimento e o futuro é sombrio, sem perspectiva e com ausência de planos. Surge a ideação e a tentativa de suicídio, que pode culminar com o ato suicida.

 

 

Quais são os principais distúrbios relacionados à prática do suicídio?

Os principais distúrbios relacionados à prática do suicídio são: Pessoas portadoras de doenças mentais, como depressão, transtorno de humor bipolar, uso abusivo de substâncias (álcool, drogas e fármacos), transtorno da personalidade compreendem mais de 96% das pessoas que praticaram suicídios. Não podemos esquecer que fatores sociais, psicossociais e outras enfermidades graves também podem apresentar um risco. E que situações estressantes e negativas podem atuar como um gatilho.

 

Para finalizar, é possível prevenir o suicídio?

O suicídio é uma situação extrema, grave em que o indivíduo tem como objetivo acabar com a própria vida. Sua compreensão é complexa e envolve a análise de diversos fatores. Alguns fatores relacionados ao suicídio são potencialmente tratáveis. Acredito que um esforço governamental para implantar uma melhoria do sistema de diagnóstico e tratamento das doenças mentais, uma maior qualificação dos profissionais de saúde de atenção básica para detectar precocemente os distúrbios mentais. Não podemos deixar de citar aqui que muitas destas patologias iniciam na infância e adolescência e que seu diagnóstico e tratamento precoce poderiam melhorar a qualidade de vida destes pacientes. Uma rede de tratamento ambulatorial adequada para tratar os pacientes portadores de doença mental. Uma estrutura adequada para atender os pacientes graves ou em surtos. Um trabalho com a sociedade com o objetivo de difundir o conhecimento sobre as patologias mentais, ensinando a dar o suporte necessário que estes pacientes necessitam. Juntos podemos mudar esta história!

Diário de Manhuaçu

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