Acredito que todos, ou, no mínimo, a grande maioria, conhecem essa eterna frase cunhada por Raul Seixas em sua icônica música, Metamorfose Ambulante. O título da canção, e a música em si, são autoexplicativos, e falam sobre se viver em uma constante transformação, em constante mudança, falam sobre a vontade do artista de ser sempre uma nova pessoa, ser diferente, buscando não se estagnar nas mesmas ideias, nas mesmas opiniões, nas mesmas impressões sobre as pessoas, sobre a vida, sobre o mundo, sobre tudo… Raul fala sobre sua vontade de estar em constante Metamorfose, em constante transformação, sempre se reinventando e modificando suas impressões sobre o mundo, sobre o amor, sobre as pessoas e, principalmente, sobre si mesmo.
A música de Raul nos lembra de uma realidade que na maioria das vezes nos esquecemos; a constância do Universo. Ela nos faz pensar que, querendo, ou não, tudo em nossa volta está em constante processo de mudança, de transformação, de metamorfose, e que cada um de nós, mesmo sem percebermos, somos afetados e, consequentemente, transformados por esses processos.
Heráclito, um dos mais influentes filósofos gregos pré-socráticos, tinha um bom entendimento sobre a constância na transformação do universo. Heráclito viveu em Éfeso, aproximadamente nos anos 535 a.C. – 475 a.C., e é considerado o “Pai da Dialética”, e o cunhador do conceito de “Logos” – também conhecido como “Verbo” –, o qual Heráclito dizia que era a “Verdade” (conceito esse que veio ganhar maior destaque mais de 500 anos depois, ao ser usado por João como introdução ao seu Evangelho). Sobre a constante transformação das coisas, Heráclito cunhou uma frase que veio a se tornar bem conhecida com o tempo; Heráclito dizia que: “Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”.
Segundo Heráclito, ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois as suas águas mudam, estão em constante movimento e, nós mesmos, ao entrar pela segunda vez, já não somos mais os mesmos de antes. Mesmo que o “rio” se encontre geograficamente no mesmo lugar de antes, a sua essência não é mais a mesma, aquilo que o torna um rio, ou seja, as suas águas, não são mais as mesmas, foram trocadas, transformadas, renovadas pelo seu jorrar constante.
Mesmo diante do fato de que somos transformados todos os dias, que estamos em constante metamorfose a cada instante, não é raro encontrarmos pessoas que insistem em continuar sendo “iguais”, sempre as mesmas; com a mesma “cabeça”, os mesmos erros, os mesmos problemas, as mesmas histórias, os mesmos conceitos, a mesma pequena visão de mundo. Diante da constância de tudo, decidiram permanecer iguais, por mais que os anos se passem, se fechando a tudo que poderia os transformar em pessoas melhores. E, o pior de tudo; Elas têm orgulho de serem assim.
Nesse ano que ainda está no seu início, que venhamos a fazer uma pequena reflexão: Vale a pena continuar sendo a mesma pessoa, tendo os mesmos problemas, cometendo os mesmos erros, firmada nos mesmos conceitos, repetindo sempre as mesmas respostas, a mesma cadeia de pensamentos, tendo a mesma visão ínfima de mundo… tendo sempre “aquela velha opinião formada sobre tudo”? Ou não seria melhor que, reconhecendo que seremos sempre pessoas diferentes, querendo ou não, nos tornarmos conscientemente pessoas melhores a cada dia, buscando agregar em nós as coisas boas, os bons exemplos, os bons ensinamentos… deixarmos ser mudados por cada livro lido (não é essa a finalidade da leitura?), por cada filme assistido, por cada conversa com as pessoas, pela nossa convivência e passagem pela vida?
Que venhamos a ser como o rio de Heráclito: nos mantendo em constante mudança, constante transformação. No mesmo local geográfico, mas nunca a mesma essência. O mesmo corpo, mas nunca a mesma pessoa, nunca a mesma “cabeça”, nunca a mesma mente… sempre em constante mudança e renovação, sempre para melhor, e que não tenhamos medo de ser uma “metamorfose ambulante”.
(Wanderson R. Monteiro)
São Sebastião do Anta – MG