Dubes Sônego Jr, com sua vasta experiência no campo jornalístico, compartilha ideias sobre como o jornalismo pode se manter relevante em um cenário de rápida transformação, sem perder sua essência local e seu compromisso com a verdade
DA REDAÇÃO – Na era digital, o jornalismo local enfrenta desafios inéditos, mas também novas oportunidades para se reinventar e fortalecer seu papel nas comunidades. Em entrevista com Dubes Sônego Jr., jornalista, fotógrafo e pesquisador do Atlas da Notícia (Projor – Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo) para a região Sudeste, discutimos a relevância dos meios de comunicação locais, especialmente em pequenas cidades do interior do Brasil, e como esses veículos podem se adaptar às novas demandas da audiência digital. Sônego, com sua vasta experiência no campo jornalístico, compartilha ideias sobre como o jornalismo pode se manter relevante em um cenário de rápida transformação, sem perder sua essência local e seu compromisso com a verdade. Ele também explora alternativas para garantir a sustentabilidade financeira das publicações locais e a importância da qualidade da informação em tempos de desinformação. Em um momento em que as redes sociais moldam o consumo de notícias, é crucial entender como os jornais podem usar as plataformas digitais para fortalecer a democracia e servir melhor as suas comunidades.
Essa entrevista revela a visão de um especialista sobre o papel vital do jornalismo local e os caminhos para um futuro mais colaborativo, transparente e inovador.
Qual é a importância do jornalismo local na era digital, especialmente nas pequenas cidades do interior do Brasil?
Há muitas questões, de interesse municipal, pelas quais normalmente só o jornalismo local tem interesse. Os impactos que um pacote econômico anunciado pelo governo federal terá na cidade, por exemplo. Ou a construção de uma nova rodovia, que trará investimentos para a região. Ou uma nova linha de incentivos fiscais do governo estadual a um setor específico da economia, particularmente forte na cidade. São assuntos que dificilmente serão cobertos pela mídia nacional, mas que são de extrema relevância para o público local. Além disso, é na mídia local que a população se vê representada, em suas manifestações políticas, culturais e artísticas, e são registrados os acontecimentos da cidade para a posteridade.
Como os jornais locais podem se adaptar às novas demandas do público, que está cada vez mais presente nas redes sociais?
No Atlas da Notícia, observamos uma clara migração da mídia impressa para o meio online. Isso, em muitos casos, significa não apenas criar um site, mas também perfis em redes sociais e canais de relacionamento com os leitores em aplicativos de mensagem, como WhatsApp e Telegram. É um trabalho que exige adaptação da linguagem, e mais mão de obra, mas que vem sendo seguido por muitas empresas, justamente pelo fato de os leitores estarem cada vez mais presentes nas redes sociais.
Com a popularização das redes sociais, muitos jornais locais enfrentam dificuldades financeiras. Quais são as alternativas viáveis para garantir a sustentabilidade financeira dos jornais impressos nesses municípios?
Essa é uma questão em aberto. Porque, se por um lado a internet e as tecnologias digitais baratearam e facilitaram imensamente a criação de novas mídias e a produção de notícias, por outro colocaram em xeque o modelo de negócio da mídia tradicional, baseado na venda de publicidade. Hoje, as redes sociais e sistemas de busca oferecem aos anunciantes formas muito mais baratas e eficientes de alcançar os consumidores do que jornais, revistas e sites. Dentro dessa nova realidade, o que vemos muitos veículos buscarem é uma combinação de diferentes fontes de receita, que incluem publicidade, assinaturas, conteúdo pago, conteúdo patrocinado, publicidade legal, eventos e patrocínio institucionais, entre outros. Uma boa referência para quem quer saber o que está sendo feito por veículos nativos digitais em relação a modelo de negócios é o Projeto Oasis: https://ajor.org.br/pesquisa-oasis-novo-relatorio-analisa-exclusivamente-dados-do-ecossistema-de-jornalismo-nativo-digital-no-brasil/.
Os jornais do interior podem competir com a velocidade e o alcance das redes sociais? Quais estratégias eles devem adotar para atrair a audiência jovem, que está mais conectada online?
O jornalismo profissional entrega, ou deveria entregar, algo que as redes sociais são incapazes de fazer: credibilidade. A checagem de informações, a separação do que é fato do que são boatos e opiniões, é uma das grandes virtudes do jornalismo. As redes sociais não fazem e, cada vez mais, se negam a fazer este trabalho. Daí as crescentes críticas que recebem e as discussões sobre regulamentação das redes. Mas o jornalismo pode usar a infraestrutura e o alcance dessas plataformas para se diferenciar entregando informação de qualidade, mais completa, precisa e contextualizada.
Há um papel fundamental do jornalismo local no fortalecimento da democracia em cidades do interior? Como os jornais podem contribuir para isso?
Sim, sem o jornalismo local as pessoas frequentemente sabem mais sobre o que acontece em Brasília, pela TV ou sites nacionais, do que na esquina de suas casas. Com isso, têm menos informações para formar opinião sobre projetos, obras e acontecimentos que têm reflexos diretos sobre o dia a dia de sua comunidade.
Como os jornais podem melhorar a qualidade do conteúdo jornalístico em cidades menores?
Parte da resposta está na questão quatro. A qualidade da apuração e o uso de mídias sociais para ampliar o alcance são questões chave.
O que as redes sociais têm que oferecer para os jornais locais no sentido de colaboração ou apoio, sem comprometer a independência jornalística?
As redes sociais podem ser uma forma barata de distribuição de notícias. Também são um excelente canal de relacionamento com os leitores e podem ser ponto de partida para a elaboração de pautas (identificação de assuntos quentes, busca por personagens, etc.).
O jornal impresso está realmente no fim, ou ele pode evoluir para se tornar uma parte complementar de um modelo híbrido de mídia?
Hoje, é uma parte complementar. Mas o custo elevado de impressão e distribuição tende restringir o uso do papel a projetos especiais, muito pontuais.
Como os jornais locais podem inovar na sua presença digital sem perder sua essência e identidade local, que é o que os torna únicos e relevantes?
A cobertura local é o que torna os jornais únicos. É o que tem de mais exclusivo, de único. É onde a grande mídia não está, e onde as redes sociais entregam geralmente apenas informações sem contexto, imprecisas, incompletas ou ou mesmo falsas”.
Quais boas práticas podem ser implementadas pelos jornais do interior para fortalecer a confiança do público na informação que é disseminada, especialmente considerando o ambiente de desinformação nas redes sociais?
Ver resposta da questão quatro. Além disso, transparência, um relacionamento forte e constante com as instituições da cidade e com os leitores. Pensando nisso, o Projor lançou recentemente um manual de melhores práticas, que pode ser acessado aqui: https://www.projor.org.br/manual-de-melhores-praticas-para-os-indicadores-de-compromissos-com-o-publico/
- “O jornalismo profissional entrega, ou deveria entregar, algo que as redes sociais são incapazes de fazer: credibilidade”, destaca Dubes Sônego Jr. (Foto: Freepick)
- Dubes Sônego Jr., jornalista, fotógrafo e pesquisador do Atlas da Notícia