Artigo

OS DESMANDOS GOVERNAMENTAIS E A IMPRESCINDIBILIDADE DO JUDICIÁRIO

O judiciário não é perfeito. Temos várias críticas (válidas e necessárias) acerca da atuação judicial no Brasil. O ponto todo é: antes imperfeito do que malfeito. Os nossos representantes eleitos parecem se adequar à segunda opção. E o pior, a maioria (relevante maioria) das pessoas não enxergam isso (na verdade, alguns até enxergam, mas me permitirei a pensar que não).

Não é crível que o cidadão eleito consiga aparentemente governar mas, substancialmente, não governar. Aliás, o incrível rompe as barreiras do Estado subdesenvolvido. No Brasil, o simbolismo político é capaz de tudo. Para o sistema político brasileiro, incapaz de se autoproduzir, não é tarefa complicada a sua penetração desaforada no sistema jurídico. Interesses pessoais, de poder, são, e parecem ser cada vez mais, o objetivo precípuo daqueles que deviam fazer o devido. O poder não pode ser um fim em si mesmo, mas infelizmente está sendo.

Enquanto a população comemora a morte da corrupção, pasmem, o Congresso Nacional aprova leis que declaram seu renascimento. Peço perdão pelo equívoco semântico, aliás. Na vida humana, não há renascimento daquele que não morreu.

O que espanta é que parece que, materialmente, elevadíssima parcela populacional não concorda com o que acontece no governo como um todo. Porém, creio que, por engano, pensam que concordam. Um exemplo que dou: um casal, aparentemente saudável, defende um ao outro com unhas e dentes. Na ocasião, mesmo que um ultrapasse os limites recomendáveis do relacionamento, caso o outro ainda não saiba do escape, continuará a patrocinar a defesa do companheiro.

Acho que, escrevendo o texto, encontrei a palavra para definir-lhe: traição. E não é qualquer delas, é uma traição maldosa, que nunca teve outra intenção, senão o mal. Raramente conseguimos eleger boas pessoas, pois a bondade costuma se mostrar ilusória. O problema todo é que dificilmente a detectamos, nem antes, nem durante, e nem depois que tudo desmoronou.

A intenção desta escrita não é produzir soluções e sim refletir sobre o que mencionei quando do seu início: o judiciário parece que tem sido nossa melhor opção. O que se vê, pelo menos, é que os erros judiciais geralmente nos indignam ideologicamente, sendo que, por outro lado, os erros governamentais não estão nos indignando, mas sim reduzindo nossas expectativas existenciais.

Nesse espectro, abordo, ainda, uma questão que estava quase esquecendo de mencionar: a vitória ideológica e moral no Brasil parece ser mais relevante que a própria qualidade de vida. O orgulho parece importar mais do que esperança de uma vida melhor para todos. É a ilustração escorreita da injusta troca que ocorre da dignidade humana pela ousadia pessoal. O que vejo acontecer é: nas redes sociais, aclamam vitória, nas conversas familiares, reclamam de adversidades.

Portanto, abdicar de parte do meu orgulho em prol de justiça material me parece uma opção preferível. É que os governantes usam o título de eleito para imaginar que há apoio popular em suas decisões, sendo que a verdade é que não sabemos mais como lutar. Nesse ponto, a independência funcional do judiciário tem se mostrado mais esperançosa.

Esse é um texto que foi feito às pressas, sem preparo, mas talvez não ficou claro a sua real intenção. O que pretendo é, talvez, fazer com que alguns reflitam sobre a importância do nosso poder judiciário. As coisas poderiam estar piores, e muito piores.

O papel contramajoritário das cortes se mostra cada vez mais imprescindível para a democracia deliberativa brasileira. Não estamos relegando o papel da população que, validamente, elege o governante. O cerne da questão é que talvez sejamos fracos para combater os desmandos, pois o poder que nós temos se transforma em uma força muito mais nociva quando o transferimos para aquele que deveria corresponder às nossas expectativas, mas, infelizmente e não raro, não o faz.

 

Gabriel Melo Dutra – 11/11/2021

Diário de Manhuaçu

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