Artigo

OS TEMPOS QUE CORREM NO PRESENTE SÉCULO: QUO VADIS DOMINI?

José do Carmo Veiga de Oliveira[1]

Dias atrás estávamos comemorando a virada do século e do milênio – 1999/2000. No entanto, os dias foram passando e um ano após outro foi se completando e deixando para trás o sentimento de que estamos todos submetidos aos efeitos inadiáveis do passar o tempo. Vimos nesse período diversos acontecimentos que foram se acumulando e, alguns deles, até se tornando rotina em cidades muito pequenas e, em se falando de cidades grandes, os eventos trágicos cada vez mais crescentes, como se tudo fosse normal e nada que se esperava poderia aplicar para estancar a sequência de ilícitos neste imenso País, pois, tornou-se rotina e a população foi se “acostumando”, porque grande parte de tudo transformou-se numa crescente estatística, muito triste e infelizmente, os números foram sendo contabilizados sem uma reação adequada para efeito de fazer cessar as tragédias geradas pelos infaustos acontecimentos chamados de “sociais”.

O fato é que com o passar dos anos as pessoas foram se adaptando a tristes realidades, de modo que muitos perderam suas vidas, seja por causa de um tiro, mesmo depois de ter sido surrupiado em seu celular, carro, moto, bicicleta e outros bens, alguns mais valiosos e outros nem tanto. Mas, o que conta realmente é a pequenez do valor que se atribui à vida humana, mormente em se considerando os tiros oriundos de “balas perdidas”. A cada dia que se passa menor valor tem a vida e de nada nos adianta ficar assistindo a essas tragédias sem uma reação plausível, capaz de produzir efeitos que poderiam mudar o curso da existência humana.

Quando olhamos para o passado e buscamos compreender ou nos posicionar a respeito de fatos de tal ordem, acabamos por nos perder ao tentar “contabilizar” as tragédias que vão se acumulando, a despeito de toda a nossa inércia cada vez menos ativa. Vidas ceifadas, pais perdendo filhos, filhos ficando órfãos e tudo parece adequado ao nosso ritmo de vida urbana ou rural. As grandes cidades acumulam, a cada dia, um número cada vez maior no que se refere aos seus moradores em termos de desemprego, moradia, violência desmedida, e tudo o mais com o que aprendemos a conviver como se tudo isso fosse normal.

Não fosse tudo isso suficiente, estamos há mais de um ano convivendo com uma outra situação que vem dizimando centenas de milhões de pessoas mundo afora: a conhecida Covid-19 e, para os “produtores de números trágicos”, parece que apenas se aprendeu a noticiar o que há de pior em nossa sociedade: mortes e mais mortes. Não se considera, definitivamente, para esses que preferem aterrorizar a população ter uma calculadora em que se contabiliza apenas as mortes, visando, exclusivamente, elevar os dados nefastos porque, ao que tudo indica, é essa a melhor forma de “vender” a tragédia alheia com números estratosféricos de mortes, mesmo aquelas que não são frutos da pandemia. Chegou-se até mesmo a produzir uma filmagem de um funcionário de certo cemitério simulando que estava cavando uma sepultura e, quando se viu que tudo não passava de uma cena dantesca, os profissionais que lá se encontravam retiraram-se e deixaram o local quando um deles percebeu que estavam sendo filmados porque mais uma sepultura estava sendo preparada para um corpo ainda desconhecido e sem identidade.

A questão é: o homem está se distanciando a cada dia e se isolando de forma tal que nem mesmo está se apercebendo do que ocorre ao seu derredor, pois, é muito mais aterrorizante andar pelas ruas e testemunhar tudo isso que simplesmente continuar recluso em sua casa, trabalhando em home office e deixando que as coisas ruins continuem acontecendo lá fora.

Seguramente, a explicação mais adequada para tudo isso é que a vida humana está perdendo o seu valor em termos de famílias dos outros, de ausência de um relacionamento mais amistoso e, especialmente, voltado para o Nosso Criador. Desde que o homem preferiu transgredir a ordem de Deus no Éden, tudo passou a ser “normal” e a cada dia se torna ainda mais “comum”. Todavia, o que sempre foi comum não tem nada de normal. O comum é aquilo que acontece todos os dias e que, infelizmente, está perdendo a sua condição de comum para alcançar o status de normal, sem qualquer tipo de resistência ou uma palavra que possa fazer a sociedade olhar para o abismo que se aproxima a cada dia, como se fosse uma grande fenda que se abre na terra e para onde, inexoravelmente, será o nosso destino, algo absolutamente inevitável.

É inescondível o fato de que não podemos mais fechar os nossos olhos para a realidade social, econômica e, especialmente, na esfera política. Os efeitos da pandemia estão assolando a população enquanto se discute em CPI’s os efeitos dos desvios de bilhões de reais que deveriam estar sendo aplicados na preservação da existência humana. Isso parece até mesmo uma pandemia que produz lucro para uns, enquanto aqueles que deveriam estar sendo tratados, assistidos e recuperados em sua saúde e vida, passam a ocupar sepulturas em cemitérios que, em muitas cidades, estão sendo ampliados por falta de espaço para sepultar outros e mais outros.

Parece-nos, no entanto, que esse tipo de situação está sendo assimilada pela população como se tudo fosse, novamente, normal, inevitável, inadiável. O sofrimento das famílias que estão sendo atingidas e perdendo seus entes queridos, parece dentro de um padrão de normalidade. Recentemente, uma pessoa conhecida, perdeu o marido, deixando dois filhos menores sob os cuidados de sua esposa. No entanto, o que mais nos abalou foi exatamente o fato de que, naquele começo de pandemia, eles sequer puderam se despedir do pai que tanto amavam e, assim, tiveram que se consolar com a informação de que eles estariam submetidos ao perigo do contágio e que também pereceriam.

Essa é a nossa triste realidade. Mas, ao que tudo indica, fomos nos acostumando aos trágicos acontecimentos sociais, políticos, jurídicos e a cada dia tudo foi se tornando normal. O lugar destinado ao “comum” foi perdendo espaço e, assim, vimos o normal tomar conta das calamidades, mediante fácil aceitação social. Estamos nos tornando um povo acostumando-se ao normal, sem esboçar qualquer reação. Temos visto manifestações políticas e de pouco ou nenhum efeito prático. Mas, as tragédias estão batendo à porta do lado. O difícil vai ser o dia em que bater à nossa porta. Como superar os seus efeitos? Essa é uma pergunta que não vai se calar, até chegar o dia em que tivermos que conviver com a ausência de nossos entes queridos.

No entanto, a despeito de todo o possível pessimismo que possamos estar transmitindo por esse artigo, temos uma convicção que é inabalável: a nossa esperança está em Jesus Cristo, o único e absoluto Senhor de todas as coisas e a nossa esperança há de ser acolhida pelo Seu sacrifício na cruz, em nosso lugar, porque ao se entregar à morte de cruz, Ele morreu a nossa morte para que vivêssemos a Sua vida. Ele esvaziou a direita do Pai quando nasceu em forma humana e, ao final, afirmou: “Tudo está consumado” e “em tuas mãos entrego o meu espírito”. Olhemos para a cruz de Cristo e tomemos a nossa cruz para que, no dia do grande encontro, sejamos capazes de segui-lo na jornada que nos está foi preparada. Mas, não nos esqueçamos que o caminho é longo, podendo ser alvo de muito sofrimento. Mas, é Ele que o Pai enviou para recolher aqueles a quem Ele quer bem. Ninguém será deixado para trás dentre aqueles que o Pai Lho entregou, por meio do seu sacrifício mediante morte e morte de cruz.

Estejamos, portanto, a cada dia, mais conscientes de que, a despeito de toda essa trágica realidade que estamos vivendo, apenas Ele pode confortar e aquecer nossos corações, consolando os que choram e resgatando aqueles que foram separados desde a Eternidade para estarem aguardando o grande encontro com Ele.

Saibamos, no entanto, que nada foge à Sua percepção, porque nossos dias estão contados e determinados desde antes da Eternidade. Essa é a nossa absoluta certeza, plantada em nossos corações para todo o sempre. Portanto, que esse texto seja o fundamento de nossa reflexão no contexto em que nos encontramos. Deus seja louvado e exaltado em todo tempo e lugar, para todo o sempre!!! Logo, quo vadis Domine? Para onde vamos, Senhor??? Impossível não formular essa indagação!!!

[1] JOSÉ DO CARMO VEIGA DE OLIVEIRA é Professor da PUC-MINAS e da Universidade Presbiteriana Mackenzie – SP; Mestre em Direito Processual pela PUC-MINAS; Doutor em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie-SP; – Assessor Especial da Consultoria do Instituto Presbiteriano Mackenzie – SP; Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Salamanca – Espanha; Desembargador Aposentado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais; Membro da Academia Paulista de Direito, do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e da Academia Mackenzista de Letras.

Diário de Manhuaçu

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