Maianny Rocha de Moraes Costa, presidente da Comissão de Saúde Mental da OAB Caratinga, explica a atualização da Norma Regulamentadora nº 1, promovida pelo Ministério do Trabalho e Emprego
CARATINGA – Em um cenário cada vez mais dinâmico e exigente no mercado de trabalho, a saúde mental dos profissionais se tornou uma prioridade nas discussões sobre o ambiente corporativo. Para debater esse tema de extrema relevância, o DIÁRIO entrevistou a advogada Maianny Rocha de Moraes Costa, presidente da Comissão de Saúde Mental da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Caratinga.
Durante nossa entrevista, Maianny traz à tona a recente atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), promovida pelo Ministério do Trabalho e Emprego, que introduz a obrigatoriedade de identificar e gerenciar riscos psicossociais no ambiente de trabalho, ou seja, fatores como estresse, assédio e carga mental excessiva devem ser identificados e gerenciados pelos empregadores como parte das medidas de proteção à saúde dos trabalhadores.
“Descanse; um campo que descansou dá uma colheita abundante”
Os gestores têm que entender as necessidades dos colaboradores. Uma frase do poeta Ovídio diz: “Descanse; um campo que descansou dá uma colheita abundante”. Essa frase pode ser vista como uma metáfora que reforça a importância de pausas e descanso para garantir um resultado produtivo e saudável a longo prazo. Assim como um campo precisa de descanso para produzir uma colheita abundante, os profissionais também precisam de momentos de recuperação e equilíbrio mental para garantir seu bem-estar e eficiência no trabalho.
Essa analogia pode ser conectada à atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1) do Ministério do Trabalho e Emprego, que agora exige a identificação e gestão de riscos psicossociais no ambiente de trabalho. Esses riscos psicossociais são fatores que podem causar impactos negativos na saúde mental dos trabalhadores, como o estresse, a sobrecarga de tarefas e a falta de apoio emocional. Quando esses fatores não são identificados e tratados adequadamente, a “colheita” do trabalho – ou seja, os resultados e o desempenho – são prejudicados.
Assim, a NR-1 promove a ideia de que, assim como um campo precisa descansar para se recuperar e produzir bem, os trabalhadores também necessitam de um ambiente de trabalho que favoreça sua saúde mental, permitindo períodos de descanso, apoio e equilíbrio. A gestão desses riscos psicossociais é como garantir que o “campo” esteja sempre pronto para dar frutos, com a colheita sendo abundante quando há atenção ao bem-estar dos trabalhadores.
Em resumo, tanto o campo quanto os profissionais precisam de cuidados e descanso para garantir que, ao final, os resultados sejam positivos e sustentáveis.
A entrevista com a advogada Maianny Rocha de Moraes Costa tem o objetivo de abordar como essa normativa representa um marco na proteção da saúde mental dos trabalhadores, e a importância de um ambiente laboral que não só respeite, mas promova o bem-estar emocional dos colaboradores.
O que exatamente muda com a atualização da NR-1 e qual é o impacto para as empresas em relação à saúde mental dos empregados?
A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), promovida pelo Ministério do Trabalho e Emprego introduz a obrigatoriedade de identificar e gerenciar riscos psicossociais no ambiente de trabalho, visando à saúde mental dos trabalhadores.
A atualização determina que as empresas incorporem a avaliação de riscos psicossociais no processo de gestão de Segurança e Saúde no Trabalho. Isso significa que, além dos riscos físicos e ergonômicos, devem ser analisados fatores como estresse, assédio moral, sobrecarga de trabalho e outros elementos que possam comprometer o bem-estar mental dos empregados.
Com essa exigência, as empresas devem adotar medidas preventivas e corretivas para minimizar esses riscos, garantindo um ambiente de trabalho mais saudável e seguro. O cumprimento dessa obrigação não só protege a saúde dos trabalhadores, mas também reduz passivos trabalhistas e fortalece a cultura organizacional, promovendo maior produtividade e engajamento.
A NR-1 obriga todas as empresas a criarem normas específicas para a saúde mental ou apenas aquelas de setores específicos?
A atualização da NR-1 se aplica a todas as empresas, independentemente do setor de atuação, tornando obrigatória a inclusão da avaliação e gestão dos riscos psicossociais nos programas de Segurança e Saúde no Trabalho. Essa exigência reforça a necessidade da observância da saúde mental, que pode impactar diretamente os trabalhadores e empregadores.
Quais são as implicações legais para uma empresa que não cumprir o prazo de implementação da norma até o final de maio?
O descumprimento das novas exigências da NR-1 pode resultar em penalidades administrativas, como multas e, a depender da situação, interdição de atividades, aplicadas pelos órgãos de fiscalização. Além disso, a empresa pode ser responsabilizada judicialmente caso a omissão na gestão dos riscos psicossociais resulte em danos à saúde dos trabalhadores, gerando ações trabalhistas e pedidos de indenização.
Manter a conformidade com a norma não é apenas uma obrigação legal, mas uma medida essencial para a proteção dos empregados e a preservação da saúde pública, de modo geral.
A adoção de boas práticas na gestão dos riscos mentais reduz a exposição a passivos trabalhistas e contribui para um ambiente organizacional mais seguro, produtivo e alinhado às exigências regulatórias.
Como as empresas devem adaptar seus programas de saúde e segurança para incluir questões de saúde mental como riscos ocupacionais?
As empresas devem identificar e avaliar os fatores psicossociais que possam impactar a saúde mental dos colaboradores, garantindo que esses riscos sejam devidamente monitorados e controlados. Esse processo envolve a realização de diagnósticos periódicos, ouvindo os empregados e analisando o ambiente organizacional para detectar situações como pressão excessiva, conflitos interpessoais e condições de trabalho inadequadas.
Além disso, é fundamental implementar políticas internas que promovam um ambiente profissional equilibrado e saudável. Medidas como treinamentos, canais de escuta e suporte psicológico são essenciais para prevenir problemas e assegurar que a empresa esteja em conformidade com as normas de Segurança e Saúde no Trabalho, reduzindo riscos jurídicos e fortalecendo o bem-estar dos funcionários.
Quais tipos de medidas específicas as empresas podem adotar para atender à nova exigência e evitar problemas trabalhistas?
As empresas podem adotar medidas como programas de apoio psicológico, treinamentos sobre gestão emocional e a criação de canais de comunicação eficientes para que os empregados possam relatar dificuldades e até mesmo disponibilizar “Vales-Terapia”.
Além disso, é essencial avaliar e ajustar as cargas de trabalho, evitando sobrecarga e prevenindo impactos negativos na saúde mental dos colaboradores, o que pode ocasionar, inclusive, Síndrome de Bournout ou Síndrome do Esgotamento Profissional.
Outra medida fundamental é a implementação de políticas claras e eficazes contra o assédio moral e outras formas de violência no ambiente profissional. Essas políticas devem ser amplamente divulgadas e acompanhadas de mecanismos de fiscalização e sanção para garantir sua efetividade.
A NR-1 coloca a responsabilidade sobre as empresas em relação aos problemas de saúde mental, ou isso se refere mais a ações de prevenção e apoio?
Embora não sejam responsabilizadas por todos os problemas de saúde mental dos empregados, as empresas têm o dever de implementar medidas que minimizem esses riscos e promovam um ambiente saudável.
A NR-1 não transfere automaticamente para as empresas a responsabilidade por problemas de saúde mental dos trabalhadores, mas exige que adotem medidas de prevenção e gerenciamento dos riscos psicossociais no ambiente de trabalho.
Os problemas de saúde mental como a Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional podem comprometer a produtividade, aumentar a desocupação e gerar um ambiente de trabalho desmotivador, além de expor a empresa a riscos trabalhistas.
Para prevenir esse problema, a empresa deve adotar medidas como a adequação da carga de trabalho, o estímulo ao equilíbrio entre vida pessoal e profissional, treinamentos sobre gestão do estresse, de modo que a saúde mental tenha a devida atenção e importância.
O que configura um “problema de saúde mental” no contexto da NR-1, e como isso pode ser documentado ou comprovado?
No contexto da NR-1, problemas de saúde mental referem-se a condições que afetam o bem-estar psicológico dos empregados, como estresse excessivo, ansiedade, depressão, Síndrome de Burnout ou Síndrome do Esgotamento Profissional e outros transtornos relacionados ao ambiente de trabalho.
Esses problemas podem ser documentados por meio de atestados médicos, relatórios de profissionais de saúde e registros internos de incidentes relacionados a fatores psicossociais ligados ao ambiente de trabalho.
Segundo pesquisas, os principais sinais de problemas de saúde mental ligados ao profissional incluem exaustão extrema, desmotivação, irritabilidade, dificuldades de concentração, insônia e alterações no comportamento, como isolamento social ou aumento da agressividade. Além disso, queixas físicas, como dores de cabeça, tensão muscular e problemas gastrointestinais, também podem estar associadas ao quadro.
Para um diagnóstico mais preciso, o profissional pode utilizar questionários padronizados, entrevistas e a observação do histórico laboral do paciente, verificando se há fatores como sobrecarga de trabalho, falta de reconhecimento e ambiente organizacional tóxico. O acompanhamento médico e psicológico é essencial para confirmar a condição e orientar o tratamento adequado, que pode incluir mudanças na rotina de trabalho, terapia e, em alguns casos, afastamento temporário.
Como as empresas podem treinar sua equipe de recursos humanos e gestores para lidar adequadamente com questões de saúde mental no ambiente de trabalho?
As empresas podem capacitar a equipe de recursos humanos e gestores por meio de treinamentos específicos sobre saúde mental, abordando a identificação precoce de sinais de estresse e esgotamento profissional, além de estratégias para lidar com essas situações.
Workshops, palestras com especialistas e cursos sobre gestão emocional e comunicação empática ajudam a preparar os líderes para oferecer suporte adequado aos empregados e promover um ambiente mais equilibrado.
Além disso, é essencial que a cultura da empresa incentive um diálogo aberto sobre saúde mental, garantindo que gestores e profissionais de RH saibam como agir diante de casos de sobrecarga ou assédio.
Criar protocolos internos para encaminhamento de funcionários em sofrimento psicológico, disponibilizar canais de apoio e estabelecer políticas claras de prevenção, são medidas que fortalecem o compromisso da empresa com o bem-estar dos trabalhadores e reduzem riscos jurídicos e trabalhistas.
Qual é o papel dos sindicatos ou das comissões internas de prevenção de acidentes (CIPA) nessa nova exigência da NR-1?
Os sindicatos e as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA) desempenham um papel fundamental na fiscalização e na conscientização sobre a inclusão dos riscos psicossociais na gestão de Segurança e Saúde no Trabalho, conforme exigido pela NR-1. Cabe a esses órgãos acompanhar se as empresas estão adotando as medidas necessárias para prevenir problemas relacionados à saúde mental, além de atuar na mediação entre empregadores e empregados para garantir condições adequadas de trabalho.
Além da fiscalização, sindicatos e CIPA também podem promover treinamentos, palestras e campanhas de conscientização sobre a importância da saúde mental no ambiente profissional. Eles podem ainda incentivar a criação de canais seguros para denúncias de assédio, sobrecarga ou outras situações que possam afetar o bem-estar dos trabalhadores, fortalecendo o compromisso com um ambiente organizacional mais seguro e saudável.
Se um empregado desenvolver problemas de saúde mental relacionados ao ambiente de trabalho, quais são os direitos dele? A empresa pode ser responsabilizada por isso?
Se um empregado desenvolver problemas de saúde mental relacionados ao ambiente de trabalho, ele possui diversos direitos garantidos pela legislação trabalhista e previdenciária.
Primeiramente, ele pode requerer afastamento médico com respaldo no auxílio-doença, a depender do reconhecimento do nexo causal entre a atividade laboral e a doença. Além disso, ele pode pleitear adaptações no ambiente de trabalho, realocação de função ou jornada diferenciada conforme recomendação médica, garantindo condições adequadas para seu bem-estar.
A empresa pode ser responsabilizada caso fique comprovado que o ambiente de trabalho contribuiu significativamente para o adoecimento mental do empregado, seja por assédio moral, excesso de carga de trabalho, ausência de medidas preventivas ou outras condutas inadequadas. Nessa hipótese, a empresa pode ser obrigada a arcar com indenizações por danos morais e materiais, dependendo da extensão dos prejuízos sofridos pelo trabalhador.
Ademais, o empregador tem o dever legal de zelar pela saúde e segurança dos seus funcionários, conforme previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e na Norma Regulamentadora, que trata da ergonomia e das condições psicossociais do trabalho.
O não cumprimento dessas obrigações pode gerar sanções administrativas, autuações pelos órgãos fiscalizadores e, em casos mais graves, ações judiciais com penalidades financeiras significativas.
- A mudança destaca que riscos psicossociais, como estresse, assédio e carga mental excessiva, devem ser identificados e gerenciados pelos empregadores como parte das medidas de proteção à saúde dos trabalhadores (Imagem Freepick)
- Maianny Rocha de Moraes Costa – Presidente da Comissão Saúde Mental OAB Caratinga