Artigo

SIMPLES SERVIDOR PÚBLICO

Ildecir A.Lessa

Advogado

 

O espetáculo público praticado, filmado e divulgado na semana passada por um  desembargador na cidade de Santos (SP), que resistiu ao uso obrigatório de máscara, que está sujeito a todo cidadão (por Decreto Municipal) e ainda, rasgou uma multa, atirando o papel no chão, lançando ofensas ao guarda municipal, na abordagem, chamando-o de “analfabeto” parece que destampa  e remete ao pensamento reinante, de uma parte do alto escalão do Poder Judiciário, que  escusa da classificação  de  ser chamado de servidor público para manter em um outro patamar de privilégios, ascendendo o debate sobre o elitismo no Brasil.

Esse desembargador Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, parece que não tem noção de que é, simplesmente um servidor público, que deve respeitar as normas constitucionais, as leis e as regras sociais. De bom tamanho, nessa oportunidade, trazer à lume o que é um servidor público. Nos termos das disposições constitucionais em vigor, servidores públicos são todos aqueles que mantêm vínculo de trabalho profissional com os órgãos e entidades governamentais, integrados em cargos ou empregos de qualquer delas: União, Estados, Distrito Federal, municípios e suas respectivas autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista. É uma designação genérica e abrangente, introduzida pela Constituição Federal de 1988, onde antes dessa introdução, prevalecia a denominação de funcionário público para identificação dos titulares de cargos na administração direta, considerando-se equiparados a eles os ocupantes de cargos nas autarquias, aos quais se estendia o regime estatutário.

Portanto, a partir da Constituição de 1988, desaparece o conceito de funcionário público, passando-se adotar a designação ampla de servidores públicos, distinguindo-se, no gênero, uma espécie: os servidores públicos civis. A relação jurídica que interliga o Poder Público e os titulares de cargos públicos é de natureza estatutária, institucional, valendo dizer que, ressalvadas as disposições constitucionais impeditivas, o Estado detém o poder de alterar legislativamente o regime de direitos e obrigações recíprocos, existentes à época do ingresso no serviço público.

Quanto especificamente à magistratura, classificação do desembargador Siqueira, essa mesma Constituição Federal de 1988 estabeleceu a vitaliciedade ao magistrado, com o argumento de permitir a execução, à perfeição, da jurisdição e garantir a independência do Poder Judiciário. Essa vitaliciedade tem como fundamento garantir a independência do Poder Judiciário nos seus julgamentos, impedindo a subordinação ou qualquer outro ato que venha a violar o Estado Democrático de Direito e diminuir a autonomia funcional do magistrado. Mas esse fundamento não sustenta porque, o que se tem verificado, que sob o manto da vitaliciedade, diversos magistrados têm cometido gravosas infrações não apenas ao próprio Poder Judiciário, mas a toda sociedade, como foi o caso do desembargador Siqueira na cidade de Santos. Ora, de registrar que, se retirar a vitaliciedade do magistrado e, desse modo, permitir a aplicação da pena de demissão, inserta na Lei Orgânica da Magistratura, não significa o fim da independência do Poder Judiciário e a coação ao exercício da função do magistrado: ela permitirá que o próprio Poder Judiciário dirima, por exemplo, casos de corrupção e outros atos abomináveis. O servidor público civil está sujeito à pena de demissão. O magistrado também deve ser, vez que é ser humano, passível de erros e condutas reprováveis, como qualquer um. Não é a aposentadoria compulsória, em caso de erro, que é uma premiação ao faltoso, considerando que não há interrupção na percepção dos vencimentos. O magistrado, ora aposentado, poderá iniciar uma nova profissão ainda percebendo os vencimentos quando exercia suas funções. Mas, o que acontece na verdade é que, o comportamento de Siqueira, embora possa não ser predominante no Judiciário, se perpetua com o silêncio corporativista dos demais magistrados.

Tudo isso remonta, das exigências absurdas dos concursos públicos, com cada vez mais elitismo, que também transformam a ideia do mérito não em uma coisa de conquista, mas de superioridade moral, o que gera uma ideologia de que a pessoa, porque passou naquele concurso público, é melhor que os outros, porque passou em um concurso muito difícil e agora é juiz. Chegou o momento do Estado brasileiro ser desmontado de suas bases patrimonialistas, encerrando por completo, essa ideia de que a pessoa que está no serviço público não é um servidor, é alguém que está acima da sociedade, porque é o Estado, quando na verdade, não passa de um simples servidor público.

Diário de Manhuaçu

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