DA REDAÇÃO – Comemoramos mais um 20 de novembro com a população preta, mais uma vez, perdendo. De acordo com o com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os negros representam 75,2% do grupo formado pelos 10% mais pobres do país. Uma realidade que assusta o povo brasileiro, mas talvez nem tanto, tendo em visto que o sistemas de cotas para ingresso ao ensino público superior, que sim é uma forma de ascensão social, ainda é pouco defendido.
Parafraseando Simone de Beauvoir: ‘No Brasil não se nasce negro, torna-se.’ Concluímos isso partindo da premissa que nascemos iguais, nos sentindo iguais, e os olhares, as oportunidades e as objeções aos copos pretos em lugares comuns, mostram que essa igualdade é apenas verso da constituição. Ao longo da história jurídica, diversos direitos foram assegurados a todo o povo brasileiro pra que tal realidade se tornasse menos abrasiva. Em um período de quase 132 anos, após a abolição total da escravatura, mesmo que sem apoio sociocultural a esses ex-escravizados, notamos um singelo avanço no modo de tratar pessoas pretas no Brasil.
A lei nº 10.639 de 9 de janeiro de 2003, determina a obrigatoriedade do ensino sobre a história e cultura afro-brasileiras nas escolas e estabelece o dia 20 de novembro como o dia da consciência negra, trazendo à memória a luta dos negros e negras, sua contribuição na formação do povo brasileiro e denunciando que a escravidão foi abolida, mas que ainda há muita coisa a ser mudada no que diz respeito ao acesso a direitos e oportunidades.
Hoje, entretanto, o inimigo se torna outro ainda mais invisível e mais velado. Intitulamos esse como ‘Racismo Estrutural’, que é a forma que, enraizada numa sociedade que não é mais escravocrata, ainda prende e inibe a liberdade de uma grande parte da sociedade. Grande parte pois segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), 56,10% é o percentual de pessoas que se declaram negras no Brasil, mesmo que nesse país nós não notamos o mesmo percentual de pessoas pretas em campanhas publicitárias, em passarelas de moda, e em lugares de visibilidade como a televisão, o cinema e os telejornais.
De acordo com a Negra Jô, integrante do Grupo de ‘Mulheres Negras Empoderadas Tereza de Benguela’, que situa-se aqui em Manhuaçu, ‘uma das formas de vencer o racismo estrutural é fazer com que pessoas brancas reflitam e reconheçam seus privilégios. ‘Combater o extermínio da juventude negra, e também combater o feminicídio em sua maior parte demulheres negras pois a morte em nosso país tem cor e local, é muito importante. Precisamos dar apoio para que pessoas negrasentrem no mercado de trabalho dando a mesma oportunidade que é dada a outras pessoas’, defende.
Passaremos mais um 20 de novembro lendo notícias como o do gerente de uma dos lojas da rede ‘Ponto Frio’, em Governador Valadares. Bruno Mendes, que trabalhou no grupo há anos, alegou ter escutado de uma senhora que seria inadmissível um homem preto ser gerente de uma loja de tal rede. Entende-se, por parte da população, que lugares de liderança ou de importância, não podem ser ocupados por pessoas pretas seja por capacidade ou por vaidade e essa mentalidade, ainda que estrutural, precisa ser destruída a cada dia.
A fórmula mais eficaz de desmontar o império racista, de acordo com outros países que vem fazendo o mesmo, é contribuindo com que corpos pretos ocupem lugares de destaque, de relevância, a ponto que possam falar de igual pra igual com o restante da população. E esse sonho de equidade, apenas irá se concretizar, quando esses corpos que sempre foram marginalizados, puderem ter oportunidades e sim, formas concretas, de chegarem ao topo por meio do poder público ou privado.
Há pouco tempo, uma campanha do grupo Magazine Luiza, divulgou uma vaga onde priorizava a contratação de pessoas pretas para cargos em sua instituição. E, mais uma vez, o ‘poder julgatório da internet’ ousou acusar a campanha de segregatícia. Segregar, de verdade, é quando olhamos para cores e raças e às julgamos, mesmo que inconscientemente, como diferentes em capacidade, valor e peso de mercado visual.
Todos os dias nascem ‘Zumbis’ diferentes, homens e mulheres pretas que, precisam resistir para não serem derrubados por um fenótipo que nada os diferem biologicamente, mas os excluem socialmente. Porém, esses e essas também são ‘Zumbis’ pela força e pela forma como conduzem suas vidas, vencendo a cada dia um sistema opressor que exclui, mata, segrega e subjulga pessoas pelo tom de pele. Essa realidade é endêmica, vem sendo diminuída, mas ainda assim é real.
No dia em que alguém, preto ou não, disser que não existe racismo no Brasil, teremos que olhar ao nosso redor, contabilizar a quantidade de pretos com diploma de ensino superior, com papéis de destaque na televisão e no cinema, com notoriedade na sociedade e mesmo assim, caso esse número seja equivalente ao de pessoas brancas, precisaremos verificar ainda a eficiência dessa visibilidade no inconsciente das pessoas. Precisa-se acreditar em um futuro melhor e mais humano, mas também é preciso lutar e criar novas formas de alcançá-lo.
Marllon Bento