Cafés especiais de Manhuaçu para a Inglaterra
MANHUAÇU – Os irmãos Rafael Gomes, 36 anos, e Otávio Gomes, 39, são os proprietários da marca Villam Gratus, que fica em Manhuaçu. Eles conseguiram mudar toda a estrutura da fazenda de café deixada pelos pais e passaram a produzir o grão especial, que esse ano foi exportado para a Inglaterra.
A reportagem esteve na fazenda Grato, que fica no córrego Maricá, distrito de São Sebastião do Sacramento, zona rural de Manhuaçu, e conversou no ambiente das lavouras carregadas de frutos, com Otávio Gomes sobre a transformação que já começa a dar bons resultados.
Otávio explica que a transformação passou por algumas fases diferentes que incluíram um investimento muito grande em reestruturar toda a infraestrutura da fazenda, passando também por um cuidado com as plantações, investindo em nutrições das lavouras, e também em processo. “Estabelecemos processos que nos permitem controlar a qualidade daquele café que a gente produz. Realizamos ainda um mapeamento dividido em talhões, que para conseguir fazer um processamento do café de maneira mais controlada, onde separa o café de acordo com a origem que ele tem das lavouras. Para cada uma das lavouras que a gente tem, nós fizemos uma divisão de acordo com faixas de altitude, onde mapeamos todos os talhões que compõe a lavoura. Com base nisso, durante o processo de colheita a gente tem um controle que permite a gente realizar um processo de rastreabilidade, onde a gente demarca a origem de cada um daqueles lotes de cafés que a gente produz. Com isso a gente consegue separar esse café durante esse processo de seca, e aí é possível controlar melhor a qualidade dos lotes individualmente”, explica o produtor.
Ainda segundo Otávio, nos últimos três anos, a fazenda passou por um processo de restruturação forte, em que ele e seu irmão Rafael trabalharam na parte de cuidado das lavouras, manejo, infraestrutura e a parte de processo, culminando com a possibilidade de desenvolver oportunidade de venda para o exterior, uma exportação direta para um cliente na Inglaterra. “Para conseguir chegar até esse ponto foi necessário um grande trabalho em termos de procedimentos, de processo, foi necessário desenvolver todo aprendizado sobre como montar essas operações, toda parte burocrática, parte de controles, mas a gente conseguiu colher frutos de todo esse investimento que a gente fez, o que contabiliza em números agora pra gente. Saímos de uma situação em que a gente fazia em torno de 30% de cafés de qualidade em 2020, para agora fazer 96%. É um ganho enorme, um ganho expressivo, fruto de todo trabalho que a gente tem feito nesse período em todas essas fases”, comemora Otávio.
E para o produtor a expectativa para safra desse ano está excelente. “De novo a gente prioriza o cuidado para chegar nesse momento com as lavouras sadias, bastante carregadas, frutos sadios, porque a qualidade começa aí, na própria planta. A gente deve iniciar a safra nas próximas semanas com o mesmo controle de qualidade, implementando melhorias em relação ao processo que a gente introduziu o ano passado para manter alto nível de controle da qualidade e garantir a qualidade do café no final”, explica.
E Otávio deixa uma dica para os produtores que querem ter café de qualidade: “a primeira recomendação é se atentar para os detalhes, o café de qualidade requer atenção aos detalhes, um cuidado grande em todas as etapas do processo. Muitas vezes colhe o café com qualidade na lavoura e perde no processo de seca, ou na armazenagem, então é importante ter atenção em todos os detalhes, e trabalhar muito”, finalizou.
A HISTÓRIA DA FAZENDA GRATO
“Para entender a nossa motivação em criar a Villam Gratus, os nossos valores, nosso nome… é importante conhecer um pouquinho da nossa história.
A Villam Gratus nasce de um contexto familiar que sempre esteve intimamente ligado ao café. Nossos pais, Toninho e Graça, se casaram em 1982 e foram morar em um terreno de um tio nosso. Na época, as condições eram muito adversas e eles estavam literalmente começando do zero. Por um período curto moraram em um casarão antigo e logo depois mudaram-se para uma casinha muito pequena, onde vivemos por mais de uma década. Era um lugar afastado e sem vizinhos próximos. São de lá as nossas principais recordações de infância.
Essa casinha, que ainda existe, era pequena em todos as dimensões, teto muito baixo, cômodos, janelas… Havia um pequeno morro próximo, onde eu e meu irmão brincávamos de carrinho. Fabricávamos nossos próprios caminhões usando latas de óleo, madeira e solados de chinelos, fazíamos estradas pelo morro e passávamos horas brincando ali. Era uma vida muito muito simples, mas posso dizer que tivemos uma infância feliz e vivemos muitas histórias engraçadas nesse lugar.
Meus pais tinham uma rotina de trabalho incansável. Nossa mãe cuidava de nós, da casa e de toda a área ao redor da casa, com horta, terreiro e quintal.
Nosso pai acordava todos os dias às 4h30 da manhã, e ia buscar trabalhadores para fazerem o serviço das roças do nosso tio e do nosso avô. No fim da tarde, ia levar os trabalhadores de volta e retornava pra casa já perto das 18hs. Uma lembrança marcante era que ele deixava o caminhão estacionado em uma varanda no alto de um morro. Todos os dias, quando ouvíamos o barulho do caminhão se aproximando, eu e meu irmão íamos correndo até essa varanda para vê-lo estacionar o caminhão e ele então descia o morro de volta pra casa trazendo nós dois pendurados pelo braço, um de cada lado.
Aos poucos, trabalhando junto com nosso tio e nosso avô, nossos pais foram crescendo. Compraram um primeiro pedaço de terra, cultivavam café, pagavam as contas… A rotina se repetia dia após dia, ano após ano. E assim foram se desenvolvendo. Em determinado momento, nós começamos a frequentar a escola em um distrito próximo. Primeiro eu, depois meu irmão. A escola ficava a 5km de distância de onde morávamos em estrada de chão. Nós íamos e voltávamos a pé pra essa escola todos os dias. Fazia sol ou chuva… não importava. Meus pais prezavam muito pela nossa educação. Eles acreditavam que a educação podia nos abrir oportunidades, nos permitir alçar voos mais distantes, apesar de eles mesmos não terem tido o mesmo contexto para estudarem. Era uma visão nobre e foi essa visão que fez com que eles se mudassem da zona rural para a cidade em 1997, a 40km de distância. Eles entendiam que na cidade, teríamos melhores condições para estudarmos e nos desenvolvermos. Mesmo morando na cidade, meu pai fazia o trajeto de ida e volta para a roça todos os dias, para continuar conduzindo o trabalho no cultivo de café.
Seguindo a visão deles, eu e meu irmão fomos estudar, trilhamos caminhos distintos na universidade e, de fato, tivemos oportunidades de vivenciar experiências que agregaram muito para os profissionais e pessoas que somos hoje. Enquanto isso, meus pais continuavam com a rotina exaustiva e seguiram crescendo com novas áreas, novos plantios de café, mais volume de produção. Até que em 2020, quis a vida que infelizmente nosso pai encerrasse a sua jornada. Desde então, nós temos passado por uma fase de transição, tanto em nossas vidas quanto nos negócios.
Então, pensando sobre toda essa história de luta e superação, não há como olhar para trás e não ser absolutamente grato por tudo o que eles fizeram por nós. E refletindo sobre tudo isso, decidimos mudar o nome da nossa fazenda para Fazenda Grato. A palavra Grato é a junção dos seus nomes: Graça e Toninho.
Mas além disso, o termo Grato representa nossa gratidão e reconhecimento pelos 40 anos de trabalho muito duro que tiveram para mudar as próprias vidas e as nossas também. Representa nossa gratidão por eles terem escolhido e ousado vencer!
E com o objetivo de abrir novas fronteiras e levar toda essa dedicação e carinho no cultivo de um café de boa qualidade diretamente para as mesas das pessoas, nós decidimos criar a Villam Gratus. Villam Gratus significa Fazenda Grato em latim e carrega, portanto, no próprio nome, os valores de reconhecimento e comprometimento que marcaram toda a nossa história”.
Por Otávio Gomes